quarta-feira, 20 de junho de 2012

Em tempos de Rio + 20



Neste último domingo, como geralmente faço, fui correr na orla de Copacabana. Para mim, esse é um dos momentos mais especiais da semana; colocar o coração pra bater forte ouvindo boa música e apreciando a bela vista. No final, ainda sento por uns 20 minutos e fico a analisar a semana que passou, e a vida como um todo. Espetacularmente prazeroso!

Mas no último domingo algo além da vista me chamou atenção; era uma manifestação contra a corrupção. Estamos no meio da Rio +20, e o Rio de Janeiro está cheio de pessoas vindas de toda a parte. E neste dia a orla estava uma bagunça (mais do que em qualquer domingo normal). Um dos manifestantes, uma mulher, trazia uma faixa escrita: "Brasil, teu problema não é ambiental, é a corrupção!".

Não demorou muito até eu me afastar dos manifestantes, eu ia na direção oposta e eles eram apenas meia dúzia. Mas a frase daquela placa não me saia da cabeça, e incomodava.

Se pensarmos que vivemos num país onde nem todo mundo tem o que comer, parece um absurdo fazermos campanhas para salvar os pinguins ou as tartarugas, não é mesmo?

A grande questão é que tanto o problema das tartarugas quanto das pessoas que passam fome é exatamente o mesmo.



No momento em que você lê esse texto, muitas crianças no Brasil estão nascendo. São 321 bebês a cada hora. Um bebê a cada 11 segundos. Para onde vão todos esses brasileirinhos?
De acordo com dados do IBGE, 8,5% dos brasileiros vivem em estado de extrema pobreza. Ou seja, são 16 milhões de pessoas neste país vivendo sem satisfazer suas necessidades básicas; de higiene, educação e saúde.

Toda essa desigualdade é resultado de um longo processo histórico, que resultou em alta concentração da renda por poucos e em uma série de governos corruptos que não geriram os fundo públicos da maneira correta. Falta educação, distribuição de renda, saneamento básico, geração de empregos. Intrinsecamente ligado a tudo isso estão nosso problemas ambientais; contaminação dos corpos d'água, construção de usinas hidrelétricas dizimando a biodiversidade em favor da produção de mais energia, desmatamento ilegal impune. Toda essa situação é mantida pela manipulação de uma sociedade majoritariamente não instruída, que contribui para a manutenção perpétua desses governos corruptos com seus votos.

Como mudar esse quadro? Precisamos urgentemente gerir nossos recursos públicos de maneira apropriada. Para isso, você e eu devemos aprender a votar melhor. E votar! E cobrar por educação, por saúde, por segurança. Somente uma sociedade mais educada será capaz de reduzir drasticamente o tamanho de sua população. Isso mesmo! Parece clichê, mas não há muito para onde fugir.

No fim das contas, somente uma sociedade pensante será capaz de dar o devido valor a sua biodiversidade, será capaz de avaliar que não precisamos somente ir em busca de novas fontes de energia, precisamos gastar menos energia! Uma sociedade mais instruída terá menos filhos inesperados, contribuindo para a diminuição da pobreza e da miséria, aumentando a dignidade humana, e dando espaço para as pessoas entenderem que tanto seres humanos quanto tartarugas têm exatamente o mesmo valor como vida nesse planeta.


terça-feira, 5 de junho de 2012

Sopa de letrinhas: genomas



Falar um pouco sobre biologia molecular e genomas era algo que estava querendo fazer já há algum tempo. Porque sempre fico imaginando o que pessoas com ocupações diversas, que não a de cientista biomolecular (como talvez você leitor), que tem seus muitos afazeres diários e pouco tempo livre pra divagar, pensa sobre essa coisa toda de genômica.

Há pouco mais de 10 anos, quando os cientistas divulgaram o mapeamento completo do genoma humano, uma grande expectativa se formou. Esparava-se que a partir de então, fossemos nos tornar capazes de curar qualquer doença de origem genética, e que era somente uma questão de tempo até que mapeássemos nossa origem e entendêssemos completamente nossa história evolutiva.  

Bem, 10 anos depois, ainda não fomos capazes de alcançar todos esses feitos. Mas estamos progredindo! Continuamos tentando dar ordem a todo esse quebra-cabeças gigante que é o estudo dos genomas, e ao mesmo tempo em que a cada dia conseguimos juntar e dar sentido às algumas peças do canto, há ainda muita peça pra se pôr no lugar.





Meu projeto de mestrado, que estou desenvolvendo nesse exato momento, também é uma tentativa de dar melhor ordem à esse quebra-cabeça. Estou montando o transcriptoma (que representa um bom pedaço do genoma, porém é um pouco menos complexo) de dois invertebrados aquáticos. Mas pra que precisamos saber do genoma de invertebrados?

Apesar de para mim, o "saber por saber" e o "entender por paixão", já serem motivos fascinantes o suficiente, talvez pra você isso não baste. A grande questão é que eu posso ter vários outros motivos (e realmente os tenho e quem sabe eles se tornarão tema de um post desse blog no futuro?), mas há uma razão grandemente inspiradora: o conhecimento do genoma de organismos menos complexos (mas nem por isso pouco complexos) com certeza nos ajuda a montar e entender nossa própria história evolutiva!

Quando os cientistas terminaram seu trabalho com o genoma humano, eles perceberam que seria necessário muito mais do que pôr em sequencia aquelas quatro letrinhas A,C,T e G. Havia ali vários padrões desconhecidos, e sem os quais não conseguiríamos chegar a conclusões muito específicas sobre nossa biologia. E foi por isso que começamos a olhar mais de perto para a genética de organismos mais simples, como o de bactérias e leveduras (que tem sido modelos clássicos de estudo da biologia por décadas!). Talvez estes possuíssem também padrões mais simples em meio a toda aquela aleatoriedade de letrinhas, e nos dariam dicas sobre nossos próprios padrões. E isso se mostrou certo!

Atualmente, os sequenciadores de nova geração baratearam muito a prática do sequencimento de genomas. Desta forma, hoje em dia é possível sequenciar também o genoma de organismos que não são famosos modelos de estudo, como os meus invertebrados aquáticos, mas que são tão interessantes quanto! É importante entender que quanto mais genomas sequenciados e estudados de espécies que estão entre as bactérias e o homem na linhagem evolutiva, mais fácil se tornará entendermos nossa estrutura molecular e o quanto ela interfere em quem realmente somos. É como num desenho de um rosto que se faz em etapas: se você simplesmente desenhar um circulo, poderá concluir que aquele desenho é muita coisa. Um sol, uma bola de futebol. Mas se, aos poucos, você incluir círculos menores formando os olhos, um rabisco no centro, indicando o nariz e incluir por fim uma linha arredondada formando um sorriso, você estará cada dia mais próximo de entender que aquele é realmente o desenho de um rosto.

Não sabemos ainda o que podemos encontra no próximo monte de letrinhas que extraírmos de uma dessas maravilhosas máquinas de sequenciar, mas posso garantir pra você que estou doida para dar uma olhada.